Teoria na Educação Física: considerações sobre um grande mito
Transposto do site http://www.educacional.com.br/educacao_fisica/naescola.asp
Ricardo Corrêa Cunha
Um dos maiores problemas da Educação Física escolar é a forma como se dá a relação entre teoria e prática. Se, por um lado, os professores demonstram cada vez mais se preocupar com conteúdos relacionados à saúde e suas bases epistemológicas; por outro, a expectativa dos alunos é de que a aula seja agradável, um momento de lazer, normalmente ligado à prática de esportes.
Conciliar a teoria e a prática muitas vezes parece uma tarefa impossível para os educadores. Mesmo quando o conteúdo é a iniciação esportiva, o professor depara com a ansiedade dos alunos na prática da modalidade propriamente dita. Assim, enquanto a preocupação do professor é ensinar a base — a parte dos fundamentos e regras básicas —, este é pressionado pelos estudantes, principalmente por aqueles com maior habilidade, a deixá-los jogar de forma livre (leia-se: sem intervenções do professor).
Em se tratando de conteúdos relativamente novos na Educação Física, como a dança, o folclore, a expressão corporal e os jogos cooperativos, a situação piora: a aceitação é baixíssima, principalmente entre os meninos, que são mais atraídos pelo caráter competitivo — o principal motivo da preferência deles por conteúdos relacionados ao esporte.
O segredo é associar três elementos: criatividade, ludismo e competitividade — esta última, de forma moderada, sem extrapolar o limite do bom convívio e da solidariedade entre os alunos. Por exemplo: o professor competente sabe que, no atual momento de sociedade “fast food”, é fundamental explanar sobre temáticas como obesidade, alimentação, saúde, etc. Entretanto, sabe também que a expectativa dos estudantes inviabilizará uma explicação meramente teórica. O que fazer?
Nessa complexa situação, o professor de Educação Física deve mostrar uma das suas maiores características — a criatividade —, estabelecendo atividades que passem intrinsecamente o conteúdo planejado e, ao mesmo tempo, atendam à expectativa de seus alunos. Em um dia de chuva, por que não fazer um jogo de perguntas e respostas sobre cuidados com a saúde em vez dos populares jogos de tabuleiro? Ou, quem sabe, fazer uma prática de encenação sobre os cuidados com a saúde na sociedade moderna? Ou ainda um tribunal simulado, colocando os cuidados excessivos com o corpo (a “corpolatria”) no banco dos réus?
Tais atividades pautadas na criatividade se caracterizam por envolver conteúdos teóricos importantes relacionados à Educação Física somados ao ludismo (atividade que traga prazer ao seu participante/praticante) e, sobretudo, à competitividade, um dos componentes principais em se tratando de agradar os estudantes e satisfazer a compreensão deles a respeito das aulas de Educação Física.
Outro ponto crucial, no que se refere à relação entre teoria e prática, é a forma de abordagem usada pelo professor. Falar em índices de massa corporal (IMC), percentual de gordura ou doping pode se tornar muito mais motivador se o educador usar, por exemplo, referências que façam sentido para os alunos. Com relação ao caso do doping, por que não discutir seu uso por atletas olímpicos? O que os motiva a fazer isso? Quais são os malefícios? E, principalmente, que soluções os estudantes diagnosticariam para esse caso? Abusando da criatividade, não seria interessante encaminhar as sugestões da turma ao próprio Comitê Olímpico Brasileiro? Com certeza, os alunos entenderiam que sua discussão teórica teria um efeito prático notável sobre a sociedade.
Em última instância, o professor deve saber que existe um grande dualismo separando (erroneamente) teoria e prática. Ambas não formam uma polaridade; pelo contrário, são faces opostas, mas de uma mesma moeda. Subentende-se, então, que uma não pode viver separada da outra.
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